segunda-feira, 4 de junho de 2018

A Profissionalização do Actor em Angola




INTRODUÇÃO

O presente trabalho aborda uma das questões mais debatidas no seio teatral angolano: “A Profissionalização do Actor”. Para melhor entender esta questão procuramos entrevistar directores, encenadores e actores de alguns grupos conceituados do país.
O mais interessante é que essa necessidade se manifestou por si só no decorrer do aprofundamento do conceito de “profissional”. Esta pesquisa vem de um anseio da compreensão do modo como podemos identificar parâmetros para um melhor entendimento do que é ser ator profissional em Angola.
Nesse sentido, importa-nos saber se para caracterizar um ator como profissional existem requisitos pré-estabelecidos na lei ou se é suficiente o facto de o artista receber uma remuneração ou, ainda, possuir já alguma experiência consolidada na área de interpretação, bem como uma formação na área em questão.
Procuramos responder questões pertinentes como: É possível viver exclusivamente do teatro? Há actores profissionais em Angola? A experiência, a formação e a remuneração condicionam o profissionalismo do actor?

I-           “PROFISSIONALIZAÇÃO”

Uma definição da profissionalização, segundo o dicionário de língua portuguesa significa acto ou efeito de se profissionalizar.
A profissionalização é, portanto, um processo de negociação, pelo jogo dos grupos sociais, com o intuito de fazer reconhecer a autonomia e a especificidade de um conjunto de atividades, e um processo de formação de indivíduos para os conteúdos de uma profissão.
A profissionalização “põe em cena” aquisições pessoais ou coletivas, tais como os saberes, os conhecimentos, as capacidades e as competências. Mais ainda, poderíamos dizer que ela reside no jogo da construção e/ou da aquisição desses elementos que permitirão, no final, dizer a respeito de alguém que ele é um profissional, ou seja, é dotado da profissionalidade (o conjunto dos conhecimentos, dos saberes, das capacidades e das competências que caracterizam sua profissão).

II-        A PROFISSIONALIZAÇÃO DO ACTOR EM ANGOLA

Actualmente não existem leis em Angola que reconhecem a profissão de actor. Existem apenas leis e regulamentos que deram os primeiros passos para regulamentação da actividade artistica. Tais como:
- SADIA, Sociedade Angolana do Direito do Autor (ver anexo);
- Associação Angolana de Teatro” vulgo AAT, que juridicamente ainda não esta reconhecida pelos órgãos tutelares;
- Lei do Mecenato (lei nº8/12 de 18 de janeiro) publicada no Diário da República (Decreto Presidencial nº 195/15, de 7 de Outubro), garante aos mecenas culturais incentivos fiscais (redução de até 40% sobre o valor total dos impostos) aos projectos implementados, bem como aos actos inerentes ao registo, candidatura, avaliação, acompanhamento e controlo dos agentes culturais beneficiários no ramo da saúde, educação e cultura.
- UNAC (União Nacional Artistas e Compositores), entidade responsável pelo cadastramento, regulamentação e controlo das actidades artísticas que no seu regulamento, capitulo III, artigo 9/2, sobre actividade artística profissional diz:
 “Nenhuma Instituição Pública ou Privada que desenvolva actividade artística no domínio cultural e artístico, pode contratar artistas que não estejam munidos da carteira profissional, sob pena de incorrer em infrações previstas no presente regulamento e demais legislação aplicável.” (Ver anexo).

III-     PROFISSIONALIZAÇÃO DO ACTOR VS EXPERIÊNCIA

O Teatro em Angola deu os seus primeiros passos antes da independência. Logo após a Independência este movimento artístico foi se intensificando até mesmo os apoios por parte do Governo e outras entidades privadas. Nos anos 80, surgiram os grupos Horizonte Nginga Mbande, Oásis e Elinga-teatro, que até hoje sobrevivem e acima de tudo com uma parte dos actores que existem desde a fundação. A década de 90 foi marcada pelo surgimento de vários outros grupos, não só a nível de Luanda como também em outras províncias.
Daí em diante foram surgindo vários grupos de teatro. Segundo o Ministério da Cultura até 2014 tínhamos só em Luanda 300 grupos Teatrais legalizados e mais de 400 clandestinos.
O que nos interessa saber se esses actores que têm no seu curriculum artístico um vasto largo anos de experiência, podem ou não ser considerados profissionais de teatro.
Durante as entrevistas 100% dos entrevistados foram unanimes em afirmar que o factor “Experiência” é indispensável para a profissionalização do actor.
Segundo a UNAC (União Nacional dos Artistas e compositores), no seu regulamento sobre a Carteira Profissional do Artista, capitulo II, no ponto dois do 8º artigo descreve:
“O artista profissional tem de ter, no mínimo, experiencia profissional artística publicamente reconhecida e comprovada por uma associação idónea”.
Mas, contudo os entrevistados não descartaram a importância que uma formação tem no processo da profissionalização do actor, pois a escola é um importante espaço de socialização com o meio profissional.


IV-       PROFISSIONALIZAÇÃO DO ACTOR VS FORMAÇÃO

Para darmos continuidade ao desenvolvimento do nosso trabalho, torna-se necessário compreender como se encontra estruturada a formação do actor actualmente em Angola, e verificar de que maneira ela está a ser orientada para o seu contributo a fim de profissionalizar o mesmo.
Em 1978, com o incremento da cooperação cubana, chegaram a Angola especialistas de teatro, para ministrarem cursos com objectivo de formar Atores-Instrutores que pudessem assegurar o movimento teatral angolano, já que o governo português, nada tinha feito a propósito. É neste quadro que vieram os formadores cubanos: Inácio Gutierres, Teresa Gonçales e Júlio Guerra. Foi um curso bastante proveitoso porque os recém Atores-Instrutores receberam material teórico suficiente que foi de grande utilidade nas suas actividades relacionadas com a disseminação do teatro em todo o país.
Além do pessoal seleccionados ainda fizeram-se inscrições públicas, e o ingresso para a frequência ao curso era feita através de um teste. Compareceram sessenta candidatos. Destes apenas vinte oito foram apurados e chegaram ao fim com êxito apenas vinte. Estes receberam a missão de levar o teatro em todo o país, como Instrutores. O curso tinha várias disciplinas entre as quais, expressão corporal, dramaturgia, direção teatral, filosofia Marxista-leninista, música, dança, língua portuguesa, teatro infantil e investigação. Foi assim a primeira formação de teatro na história de Angola.
Posteriormente foram surgindo outras iniciativas de formação. Anos depois selecionou-se um grupo de actores para terem uma formação média de teatro em Cuba.
Em 1993 o Ministério da Cultura criou o Curso Básico de Teatro que culminou na criação do INFA (Instituto Nacional de Formação Artística) que teve início em 2004, com a formação Média de Teatro, mas por causa de algumas irregularidades (infraestruturas, corpo docente…) o mesmo teve o encerramento em 2010.
Recentemente em 2007 enviou-se outros 4 angolanos para formação superior de teatro em Cuba.  
Quanto a formação do actor Angola tem verificado um crescimento significativo. Em 2015, inaugurou-se o CEART (Complexo das Escolas de Artes), onde começou-se a lecionar o Curso Médio de Teatro. No mesmo ano arrancou o Curso Superior de Teatro no ISART (Instituto Superior de Artes) instituição essa, que foi inaugurada em 2014.
Muito antes disso, em 2008, a instituição privada Metropolitana deu o primeiro passo a nível do Ensino Superior, sendo a primeira instituição universitária em Angola a lecionar um curso direcionados para actores.
Segundo os dados recolhidos pelos nossos entrevistados, a formação académica ou técnica é uma mais valia:
 “…É impossível ser um ator profissional sem ter uma formação académica ou técnica. Porque em termos de avaliação, crescimento e qualidade, sem formação técnica ou académica o ator não teria como concorrer no mercado de trabalho e continuaria no empirismo…” salientou Adelino dos Santos Caracol (Director e encenador do Grupo Teatral Horizonte Nzinga Nbande)
No mesmo diapasão o director do grupo Enigma-Teatro Francisco António, afirmou que: “…Para que um actor seja profissional precisa no mínimo de três coisas: Formação; experiência profissional no que concerne ao teatro, fazer parte de uma companhia… trabalhar regularmente e ser remunerado mensalmente…”.   
A formação académica ou técnica por si só não é suficiente para a profissionalização do actor.
       
V-          PROFISSIONALIZAÇÃO DO ACTOR VS REMUNERAÇÃO

Segundo a UNAC (União Nacional dos Artistas e compositores), no seu regulamento sobre a Carteira Profissional do Artista, capitulo II, no ponto um do 8º artigo descreve: “O artista profissional é o individuo que, exclusiva ou predominantemente, dedica o seu tempo ao exercício da atividades artística, dependendo dela a sua subsistência”.
A remuneração tem sido uma ideia muito mal compreendida no seio artístico, uma coisa é receber em certos momentos remunerações fruto do trabalho realizado e outra coisa é receber um salario mensal. Ou seja, o actor profissional é aquele que vive do que faz.
Alguns entrevistados afirmaram que atualmente em Angola é difícil viver só da profissão de ator, tais como:
·         Flávio Ferrão (Director e encenador do grupo teatral Henrique Artes- Luanda);
·         Augusto Congo (Director e ator do grupo teatral Luzes ao palco – Huíla);
·         Dr. Stive (Encenador do grupo teatral Ombaka – Benguela).
Outros entrevistados argumentaram que têm a profissão de actor como fonte da sua subsistência, tais como:
·         Francisco Pedro António (Director e encenador do grupo Enigma-Teatro/ Luanda);
·         Manuel Teixeira (Secretário de administração e finanças do grupo teatral Julu/ Luanda);
·         Raúl do Rosário (Responsável do património do grupo Elinga-Teatro/ Luanda);
·         Adelino caracol (Director e encenador do grupo teatral Horizonte Njinga Mbande/ Luanda).
A pergunta que não quer se calar e gera muitas incertezas é: em Angola é possível viver só da profissão de Actor?

                                         CONCLUSÃO
Notamos também que actualmente os grupos que hoje em entrevista afirmaram que recebem mensalmente rendimentos são aqueles que sobreviveram desde a década de 80, prevaleceram organizados e hoje têm uma estrutura e apoios que os sustem.
 A análise apresentada neste trabalho investigativo apoiou-se como já é sabido, num conjunto de entrevistas, junto de directores, actores e encenadores dos grupos de teatro angolano. O que permitiu, desta forma, contemplar uma pluralidade de trajectórias individuais, espaços de oportunidades e situações profissionais de artistas de diferentes gerações. Notamos também que Os grupos de teatro mais antigos funcionam como “escolas de teatro” e permitem às jovens gerações de actores conhecer os membros que compõem a sua comunidade e assim sendo construir as bases de um percurso profissional.
Concluímos que os actores estão em processo de formação contínua e aprendizagem constante: tirar notas, apontar ideias, assistir a outros espetáculos, fazer cursos de actualização de teatro são práticas assinaladas com frequência pelos entrevistados e consideradas imprescindíveis para o seu desenvolvimento pessoal e para um trabalho de aprendizagem em continuidade.
Durante o desenvolvimento deste trabalho, vimos que o caminho mais viável para a profissionalização do actor requer pelo menos uma formação académica ou técnica; uma experiência considerável e comprovada e ser remunerado pelo exercício da mesma atividade.

BIBLIOGRAFIAS

ASSUMPÇÃO, Priscila pinheiro. A interpretação do ator: Um estudo sobre propostas metodológicas do intérprete na Linguagem audiovisual. Lisboa, 2015.

BORGES, Vera. Actores e encenadores: modalidades de profissionalização no mercado teatral português

ABRANDES, José Mena. O Teatro em Angola. Editora Zila,  1º Ed. 

OBS: INFORMAÇÕES PRECISANDO DE MAIS SUBSÍDIOS...

Sem comentários:

Enviar um comentário

TUDO SOBRE TEATRO

ROMEU E JULIETA NO CENTRO DE CONFERÊNCIAS DE BELAS É JÁ NO DIA 23 DE JUNHO

Um dia: 23 de Junho Um Lugar: Centro de Conferências de Belas Um grupo: Zambâmbio Uma obra: Romeu e Julieta Um preço: 1.500 Kz compre...

ARTIGOS MAIS VISTOS